Em tempos de Olimpíada, os temas da hora são os esportes. Competições entre os países em diversas modalidades para ver quais são os melhores do mundo. Ao final, o quadro de medalhas ainda nos mostra quais são os de maior destaque. Entretenimento certo. Enquanto isso, ofuscado pelo grande evento esportivo, algo importante para a América do Sul acontecia em Brasília ontem e hoje. Difícil comparar com as regras, organização e diversão que as Olimpíadas proporcionam, mas, o evento foi resultado de uma competição certa e os países envolvidos já pensavam em um quadro de medalhas futuro.
Em Brasília, a sensação do governo brasileiro, uruguaio e argentino é de pódio. A entrada da Venezuela no Mercosul, formalizada pelo encontro oficial dos presidentes hoje representou uma vitória diplomática para os países. Fora da celebração, o Paraguai, único que se opunha à proposta, excluído das decisões políticas do bloco, observava de fora as comemorações e a festinha particular desses países. Agora e o quadro de medalhas? Teremos alterações de benefícios para esses países ou será que essa vitória não altera muito a situação de nossos competidores?
Antes de qualquer coisa, comecemos pelos números, os “ouros” dessa olimpíada mercosulina. O PIB do bloco crescerá em 316 bilhões, abre-se um mercado de 400 milhões de pessoas e o Mercosul poderá afetar a geopolítica internacional do petróleo, concentrando a maior parte do petróleo sul-americano. A tarifa externa do país já é de 12,5%, muito próxima da Tarifa Externa Comum (TEC) do bloco, 11%. Poucos ajustes já vão bastar para isso. Além do mais, a necessidade de exportação de 70% de seus alimentos, é mais um bom negócio para os países do bloco. A Venezuela é um bom mercado e pode trazer mais “ouros” para o bloco.
A incerteza de medalhas não vem dos números. Provém do contexto, do Mercosul e do país. Primeiro precisamos lembrar que a entrada da Venezuela foi uma grande malandragem. Bastou o único que se opunha ser afastado das decisões políticas para que se avançasse nesse assunto espinhoso. Ou seja, foi consenso, dentro dos que estavam aptos a decidir, mas não entre todos os membros fundadores do bloco. E quando o Paraguai voltar a se tornar membro efetivo, o que vai acontecer com a relação com a Venezuela?
O outro detalhe é interno ao bloco e à Venezuela. Os tais protecionismos excessivos. Dentro, o tom de amizade política tem convivido com o de rivalidade econômica. Principalmente quando o tema é Argentina. Bloqueios, restrições, taxas, taxas e mais taxas entre os companheiros de bloco. Na maioria das vezes, quando compete com as indústrias nacionais em economias problemáticas, o Mercosul fica em segundo plano. Agora, se olharmos a situação econômica venezuelana, ela não é das melhores. Instabilidade política e uma economia muito dependente de importações. Se a entrada de produtos do Mercosul quebrar muitas indústrias nacionais, a situação de instabilidade política interna do país não oferece garantias de que não sairá ampliando barreiras, principalmente se o bloco oferece um histórico de certa tolerância econômica para efeitos políticos. A última dúvida viria da personalidade de Chávez. Onde quer que ele vá, surge polêmica. Polêmicas que podem dificultar as negociações dentro do bloco e até mesmo influenciar as negociações externas, mas que podem servir de ensaio geral para a Unasul ou para um Mercosul mais ampliado ainda.
Nessa competição sul-americana, o quadro de medalhas ainda é um pouco incerto. Os “ouros” de curto prazo não dão certeza sobre os “ouros” do futuro. Mas a decisão e a malandragem de incluir a Venezuela é com certeza muito mais um cálculo político do que econômico. Tentar trabalhar para fortalecer a América do Sul devagar, passando pelos países com mais benefícios econômicos, é um objetivo justo. Entretanto, enquanto os jogadores dessa competição continuarem a disputar entre si, nem mesmo a primeira vitória vai ser tão certeira assim.
Categorias: Américas, Organizações Internacionais